A distribuição de elementos químicos (metais pesados, elementos comuns, tóxicos, etc) nos solos sob condições naturais ocorre de forma aleatória, mas generalizada, em toda área. Entretanto, as atividades antrópicas podem adicionar materiais que contêm esses elementos aos solos, os quais podem atingir concentrações muito altas, que comprometem a qualidade dos ecossistemas. Para atender aos requisitos impostos pela legislação vigente, os organismos de monitoramento ambiental necessitam de indicadores capazes de servir como referência para a avaliação continuada dos impactos ambientais causados pelas atividades antrópicas sobre os solos.
Nesse sentido, as Agências de Proteção Ambiental propõem o estabelecimento de valores orientadores que permitam identificar áreas poluídas ou contaminadas e, concomitantemente, avaliar o potencial de risco ao meio ambiente e à saúde humana. Os valores de referência de qualidade (VRQ) ou de background são orientadores que representam a medida da concentração natural de elementos químicos em solos sem influência humana. Esses valores podem ser estabelecidos a partir da determinação dos teores naturais desses elementos no solo, levando-se em consideração a variação das classes e das propriedades físicas e químicas do solo. No Brasil, com a crescente demanda social pela melhoria e manutenção da qualidade ambiental, realizaram-se alguns levantamentos dos teores naturais de metais pesados em solos com vistas a estabelecer valores orientadores para algumas regiões. Atualmente, pelo nosso conhecimento, apenas os estados de São Paulo (lançado em 2001), Minas Gerais (definidos em 2011), Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Sul (todos em 2014) possuem definidos estes valores. Conforme Reis et al (2016) em seu trabalho “Análise dos dispositivos legais nos estados brasileiros perante a Resolução 420/2009”, verificou-se que o alguns estados não cumprem a Resolução 420/2009 CONAMA por conta dos altos custos financeiros e as análises prolongadas, havendo necessidade de integração das instituições de pesquisa com órgãos ambientais oficiais para elaboração de estudos. Por conta disso, poucos estados fizeram, alguns inclusive analisaram de forma parcial a listagem completa dos elementos.
O estabelecimento de Valores Orientadores ou Valores de Referência de Qualidade do Solo (VRQs) tem sido prática usual nos países com tradição no monitoramento da qualidade de solos e águas subterrâneas no controle de áreas contaminadas e com potencial aplicação, tanto na prevenção da poluição de solos e águas subterrâneas, como no controle de áreas contaminadas. Com isto, objetiva-se o conhecimento da metodologia adotada e os valores orientadores estabelecidos como referência de qualidade, alerta e intervenção para proteção da qualidade de solos e águas subterrâneas.
O VQRS indica o limite de qualidade para um solo considerado limpo ou a qualidade natural das águas subterrâneas a ser utilizado em ações de prevenção da poluição do solo e das águas subterrâneas e no controle de áreas contaminadas. Foi estabelecido com base em análises químicas dos diversos tipos de solos. O valor de alerta indica uma possível alteração da qualidade natural dos solos e será utilizado em caráter preventivo e, quando excedido no solo, exige o monitoramento das águas subterrâneas, identificando-se e controlando-se as fontes de poluição. O valor de intervenção indica o limite de contaminação do solo e das águas subterrâneas acima do qual existe risco potencial à saúde humana. Ele será utilizado em caráter corretivo no gerenciamento de áreas contaminadas e, quando excedido, requer alguma forma de intervenção na área avaliada, de forma a interceptar as vias de exposição, devendo, assim, ser efetuada uma avaliação de risco caso a caso.
Há aproximadamente cinco anos, uma equipe multidisciplinar do Departamento de Engenharia Agronômica – DEA, da Universidade Federal de Sergipe – UFS, coordenado pelo professor Alceu Pedrotti e apoiada pelo professor Sandro Holanda, percorreram toda a área do estado coletando, aproximadamente, 40 amostras compostas de solos representativos em termos de distribuição geográfica e classes de solos, identificadas pelo atual Sistema Brasileiro de Classificação dos Solos, em distintos ecossistemas e em áreas minimamente perturbadas por atividades humanas. Após as análises químicas devidas, identificou-se na prática, os teores de diversos elementos químicos naturalmente presentes nestes solos, uma vez que os mesmos possuem condições especificas de material de origem, clima, nível de atuação de organismos, situação na paisagem e tempo de formação, aliada as condições especificas de clima ocorrentes nos diferentes locais representativos. Com isto percebe-se que em Sergipe há uma grande variabilidade de classes de solo, embora sejamos o menor estado do país. No entanto, tais classes são altamente diversificadas em associação com os diversos fatores relatados acima, o que amplia o potencial de uso dos solos frente às diversas explorações antrópicas. Desta forma, a diversificação é peculiar para as nossas condições, que muitas vezes são endêmicas da vegetação, como no caso da área do Parque Nacional da Serra de Itabaiana, tornando ainda necessário o estabelecimento dos VRQs no estado e o atendimento à Resolução CONAMA 420/2009. O desenvolvimento do Projeto, amparado financeiramente pelo CENPES da Petrobrás, contou com a participação técnica direta do pesquisador André Moreira de Souza Filho (Petrobras). A equipe do professor Gilson Moura Filho (UFAL) realizou o mesmo levantamento para o estado de Alagoas. Já o professor Germano Melo Junior (UFRN) atuou como consultor nas ações em ambos os estados avaliados.
Em dezembro de 2016, o relatório final do projeto de pesquisa foi apresentado à diretoria e ao corpo técnico do órgão ambiental de Sergipe – a ADEMA. O projeto foi desenvolvido em conjunto para o estado de Alagoas, com o apoio, além da Universidade Federal de Sergipe, das Universidades Federais de Alagoas e do Rio Grande do Norte, com apoio técnico e financeiro do CENPES da Petrobras. No final de 2018 o projeto foi aprovado no Conselho Estadual de Meio Ambiente – CEMA, órgão vinculado à Secretaria de Estado do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos – SEMARH. Em abril de 2019 foi aprovada a Resolução No. 01/2019, que dispõe sobre os critérios e Valores de Referência da Qualidade do Solo (VRQ) do estado de Sergipe no que diz respeito à presença de substâncias químicas para o gerenciamento ambiental de áreas contaminadas por essas substâncias em decorrência de atividades antrópicas. A Resolução estabelece oficialmente estes parâmetros para uso em diversas ações ambientais na abrangência do estado, servindo como importante referência para fiscalização e monitoramento em áreas impactadas, aspecto primordial, tanto para as empresas que atuam nesta área, como para o órgão ambiental responsável pelo ordenamento de tais atividades.
Através de seus órgãos reguladores, o estado de Sergipe sai à frente da maioria dos estados brasileiros, visando o ordenamento das atividades econômicas sobre este importante recurso natural. Nossos especiais agradecimentos a toda a equipe envolvida e aos órgãos integrantes desta importante ação, culminando no efetivo resultado – CENPES, UFS, UFAL, UFRN, Cenpes e Petrobras, além da ADEMA-Se. e Conselho Estadual de Meio Ambiente de Sergipe.
Alceu Pedrotti é professor na Universidade Federal de Sergipe.

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