Rede Brasileira em Sensoriamento de Solos (REBSS)

José Alexandre Demattê¹, Raúl Roberto Poppiel¹, Deorgia Tayane Mendes de Souza², Gustavo de Mattos Vasques³

A Biblioteca Espectral de Solos do Brasil (BESB), descrita em artigo publicado no blog da SBCS (https://www.sbcs.org.br/2025/03/17/4374), completou oito anos desde a publicação de seu principal trabalho científico (https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0016706118318548). A BESB já é considerada a maior biblioteca espectral de solos do mundo na faixa do Vis-NIR tanto via números privados, como nos que foram divulgados no zenodo (https://zenodo.org/records/8092774). Trata-se de um enorme feito. Apesar do nome, a BESB foi, na realidade, uma rede colaborativa que contribuiu significativamente para o desenvolvimento da espectroscopia de solos no Brasil.

A BESB, com o apoio da SBCS, FAPESP e CNPq, iniciou na ESALQ/USP, com o intuito de demonstrar o potencial da espectroscopia de solos e formar uma massa crítica nacional. Além disso, incentivou a criação de núcleos regionais, inclusive equipados com sensores. Hoje, evidencia-se que há espaço para avançar, por meio da constituição de uma rede. A presente proposta pode ser descrita como a descentralização e capilarização da BESB, o que deverá fortalecer os grupos regionais de pesquisa em espectroscopia de solos e fomentar novas parcerias.

Trata-se, portanto, de uma nova iniciativa: a criação da Rede Brasileira em Sensoriamento de Solos (REBSS). A REBSS tem como principal objetivo ser um grupo de comunicação entre pessoas interessadas no tema, onde poderão trocar informações diversas e realizar parcerias para evoluir no tema. Entre os temas que poderão ser abordados e discutidos, incluem-se: como criar uma biblioteca espectral de solos, quais protocolos vêm sendo adotados no mundo, como harmonizar e normalizar dados, como integrar as curvas obtidas por sensores diferentes, geometrias usadas para leitura de amostras, entre outros. Mais do que isso, este grupo visa discutir como colocar em prol da sociedade tal tecnologia, haja visto que uma biblioteca espectral de solos, em si, não tem valia se não passar para a fase seguinte que é torna-la um serviço acessível à população.

E como isso pode ser feito? Esse é justamente o propósito da REBSS. Mostrar e debater caminhos, integrar o grupo a pesquisadores especialistas em química, fertilidade, pedologia, pedometria e qualquer outra disciplina que venha a se interessar nessa tecnologia transversal. A REBSS terá como objetivo integrar profissionais das mais variadas disciplinas, focando em abrir caminhos, inclusive ao MRV (Monitoramento, Relato, Verificação). Além disso, a REBSS abrirá espaço para as bases do sensoriamento remoto, fazendo um upscale do nível laboratório para campo, drone e satélite.

No início, os participantes do grupo trocarão informações das mais variadas, desde eventos, fóruns, notícias, artigos científicos, algoritmos, e toda e qualquer informação que queiram disponibilizar. Após essa primeira etapa, a proposta é criar e expandir repositórios de dados e de algoritmos que facilitem a vida de todos. O objetivo da REBSS é fortalecer grupos dispersos que vêm trabalhando individualmente num mundo totalmente globalizado,em que parcerias são fundamentais para a evolução, ganho de velocidade e adoção da espectroscopia como ciência forte, interdisciplinar e sustentável.

Diferentes ações que vêm sendo desenvolvidas por diversos grupos, que constituem bibliotecas espectrais em diferentes níveis de representatividade — desde uma simples topossequência até nível estadual como vem ocorrendo pelo Brasil nos estados da BA, RS, SC, PR, SP, RJ, MG, MT, PB, PI, DF e GO. A ideia é estabelecer uma rede colaborativa voltada ao desenvolvimento de bibliotecas regionais, com aplicação voltada às necessidades da ciência e da sociedade. O papel da REBSS será fomentar e estimular os grupos na elaboração de bibliotecas espectrais institucionais, municipais, regionais ou estaduais, bem como incentivar e propor regras, modelos e subsídios para a padronização dos dados nas bibliotecas — caso o grupo considere essa padronização pertinente.

Com a participação de todos, as aplicações se multiplicam, tais como: inserção na área de ensino, criação de um sistema online para análise regionalizada de solos e incorporação da inteligência artificial. A informação espectroscópica abre novas possibilidades. Os dados podem ser abertos ou restritos, ficando a critério do participante. Atualmente, está em curso um processo de disponibilização da informação, respeitando a sua confidencialidade. Isso foi amplamente debatido em evento promovido pela FAO (https://www.fao.org/global-soil-partnership/glosolan-old/soil-analysis/dry-chemistry-spectroscopy/presentations-3rd-spectroscopy-2022/en/). Uma das formas em desenvolvimento é baseada em um modelo denominado sistema federativo de dados (https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0016706125000977), que demonstra as inúmeras possibilidades no uso de dados provenientes de sensores, sem ferir os códigos de ética, privacidade ou do esforço de cada um em conseguir dados. A REBS mostrará caminhos, facilitará a comunicação e incentivará parcerias, porém a escolha de compartilhar dados e participar das iniciativas promovidas pela Rede será sempre individual. A REBSS trará as novidades a nível internacional em como obter espectros com protocolos, geometrias, normativas, vislumbrando termos laboratórios com qualidade internacional.

A espectroscopia, como parte do sensoriamento remoto, é uma ciência transversal, que pode integrar qualquer subárea da ciência do solo, como mineralogia, gênese, carbono, fertilidade, química, microbiologia, poluição, física, classificação, mapeamento, saúde do solo, geologia, entre outras. Trata-se de uma ciência com fundamentos físicos, dinâmica e com ampla elasticidade de aplicações, tais como mapeamento e classificação de solos, agricultura de precisão, análise de solos, entre outras. A REBSS não se limitará a uma faixa espectral. O objetivo é avançar a todas as faixas disponíveis tais como raios gama, fluorescência de raios-X, ultravioleta, visível, infravermelho próximo, infravermelho médio, condutividade elétrica aparente, susceptibilidade magnética, entre outras. Daí subindo para os sensores embarcados em satélites tanto óticos e termais como radar. Da ciência fundamentada a aplicação, a REBSS irá adentrar nos sensores embarcados em tratores e outros implementos, sempre com o objetivo de ver produtos voltados a serviço da sociedade. Ainda, adentrar em sistemas de quantificação e identificação de padrões de solos via nuvem através da inteligência artificial, como um serviço à população, bem como o desenvolvimento de laboratórios de análise de solos híbridos. Por tratar-se de uma informação métrica, insere-se na disciplina da pedometria e mapeamento digital.

A comunidade científica migrará para o universo dos sensores remotos, sendo a informação espectroscópica terrestre a base para analisar os fundamentos e avançar a espectroscopia por sensoriamento remoto (via drones e satélites). Nessa nova fase o usuário poderá transitar do nível pontual ao espacial, elevando a informação para a escala desejada — regional, estadual, continental ou global. As aplicações nas áreas agrícola e ambiental são limitadas apenas pela imaginação dos usuários. No campo do sensoriamento remoto do solo, o grupo brasileiro é considerado o segundo maior do mundo em massa crítica.

Imagine uma disciplina transversal com dados métricos, passíveis de visualização em laboratório ou por satélite, sendo liderada por pesquisadores brasileiros — isso é a REBSS. Não se trata apenas de aquisição de dados ou de pesquisa, mas da formação de uma comunidade que compartilha experiências, caminha conjuntamente e fortalece a ciência nacional.

Esta proposta inicial da REBSS, está sendo fundamentada no grupo Geotecnologias em Ciência do Solo (GEOCIS) da ESALQ-USP e apoiada pela Embrapa Solos, visa criar um ambiente presencial e virtual para a troca de experiências, compartilhamento de artigos e dados, bem como a formação de parcerias, especialmente no que tange ao estudo de solos e sensores — desde a ciência básica até aplicações comerciais — conectando-se, assim, ao usuário final. Trata-se de um espaço focado em debates e discussões, com o objetivo de elevar o nível de conhecimento e integração dos participantes em espectroscopia e sensoriamento de solos, mantendo o Brasil no epicentro desta tecnologia no mundo.

Convidamos, portanto, toda a comunidade científica nacional a participar dessa nova fase, mediante sua inscrição gratuita pelo link: https://docs.google.com/forms/d/e/1FAIpQLSfSIzlLFUDjphZ5gF4MkwM2uc-Owx9KM02QQCdDuVtk4fUXIg/viewform?usp=dialog. Participe!

¹ Universidade de São Paulo, Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” (ESALQ/USP), Departamento de Ciência do Solo – LSO, Piracicaba, SP; Grupo de Geotecnologias em Ciência do Solo (GeoCiS). E-mails: jamdemat@usp.br, raulpoppiel@usp.br; ² Universidade do Estado da Bahia (UNEB), Campus XI, Serrinha, BA; Laboratório de Sensoriamento Remoto e Espectroscopia (LABESPECTRO). E-mail: dtmsouza@uefs.br; ³ Embrapa Solos. E-mail: gustavo.vasques@embrapa.br.